terça-feira, 18 de agosto de 2009

o tempo tá pouco parte 2

Podemos dizer que o corpo é sintoma da cultura uma vez que, no mundo ocidental, ele é o primeiro produto/ bem de consumo que possuímos e o tratamos como tal desde criança uma vez que vivemos em uma sociedade capitalista em que você é o que você tem. Assim, o corpo se torna o mecanismo de transformação social mais próximo que temos.

Além disso, o corpo:

  • foi o combustível da Revolução Industrial como matéria-prima: usado até exaurido e então substituído por outro mais novo para a fabricação de bens de consumo;
  • É, como foi Michael Jackson, “display, mostruário, suporte de uma ostentação de filiação presente que relega as memórias ao soterramento”;
  • É objeto de encantamento e adoração por sua perfeição, obediência total e absoluta à norma-padrão (exemplo: supermodels que usam o corpo o produto, por elas representado, de perfeição e desejo);
  • É biológico e químico, uma vez que, a juventude precisa ser preservada ao máximo já que velhice é considerada, na cultura ocidental, sinônimo de obsoleto e de finitude;
  • E é imaterial uma vez que a velocidade de existência do corpo pode variar no universo fixo e fluxo(internet) no universo biológico e semântico.

O corpo deixou de ser biológico para se tornar semântico. Vai além de meio de comunicação, ele é um catalizador de ambientes, inclusive comunicacional. Por meio das imagens o homem conseguiu a oportunidade de criar imagens sobressalentes de si mesmo, ganhando assim uma existência múltipla. Acaba-se o exíto conquistado uma única vez, a morte se distância uma vez que você se torna produto e não mais pessoa. Como produto, a possibilidade de atingir a imortalidade é maior. Por isso, segundo Norval, um ambiente comunicacional é uma atmosfera gerada pela disponibilidade dos seres, intencionalidade de estabelecer vínculos. Ou seja, uma cultura que constrói ambientes adequados a hegemonia da visão com todas as consequências que dela decorrem (JUNIOR, Norval; 2007 - p.5-6). Assim, estamos predispostos a favorecer ambientes nos quais os vínculos com outros corpos nos possibilitam sobreviver apesar de nossa finitude, uma vez que desejamos essa infinitude. E por meio delas criar histórias que se projetem além do ambiente e da fronteira.

A frase: toda comunicação começa no corpo e nele termina amplia o conceito de corpo, incluindo ele como um canal de comunicação, e ampliando este uma vez que ele incorpora fatores como vida, vínculo, historicidade e cultura[1]. A corpo se transforma em imagem, perde assim sua profundidade, volume, densidade, para acabar, como diz Norval, “destruir sua existência autônoma” (JUNIOR p.104) e transformá-la em um ícone que ocupa lugares no espaço urbano devido à sua simplicidade informativa capturada logo no primeiro olhar.

A transparência da imagem a destitui de seus valores políticos ou estéticos e a transformam apenas em informação associando-as em estratégias de marketing, governamentais, de entreteminento e do controle[2].

Hoje, vivemos a potência descontrolada da produção de imagens mediáticas e seus canais de escoamento que cresceram muito e chegaram a um ponto em que a produção artística parece se espelhar ou refletir a imagem mediática (FILHO, Norval; 2007). A cidade tornou-se uma grande tela com milhares de possibilidades de imagens que serão criadas encima de outras imagens. Um círculo infinito da imagem como instrumento. O corpo passa a refletir/ torna-se / transmitir e emitir sinais dessa imagem cultural que ao unir uma à outra pode ser vista como um ícone de um ambiente globalizado.

Nos dias atuais vivemos de forma que precisamos dialogar com o corpo em três instâncias para termos uma noção de experiência. A primeira seria o corpo em si, biológico. A segunda seriam os atributos inseridos nele e a terceira que necessita de aparatos técnicos comuns nos grandes centros urbanos sem os quais os seres humanos não experimentariam a vida presente, passada e futura já que esta está em um espaço de passagem de imagens. Essa mudança da sensibilidade do homem começou no início do século XIX como citado no princípio deste texto.

O corpo é transmissor de informações desde os primórdios da humanidade. E desenhos, ícones também fazem parte das bases de nossa sociedade uma vez que é possível ver desenhos que contam histórias de períodos mezosóicos. Ao longo da história e de acordo com a cultura em que o corpo está inserido ele se tansforma, pois tem significados diferentes. Seja o salto alto inventado na França por Luiz XV que achava que a monarquia não poderia andar no mesmo patamar dos plebeus, às roupas os colonizadores portugueses usavam e tanto os diferenciava dos ameríndios à carta de Pero Vaz de Caminha narrando o povo recém descoberto às gordinhas pré-século XV retratadas por tantos artistas às anoréxicas adoradas por tantas adolescentes nas capas de revistas.

A imagem e o corpo contemporâneo se correlacionam uma vez que já não é mais possível, a não ser em uma análise profunda, interpretar quem foi gerado a partir de quem. Nesse meio tempo surgem ícones que marcam fases, gerações, sociedades. Ícones: imagens sem nenhuma complexidade e facilmente interpretada ao ser visualizada.


[1] JUNIOR, Norval. Os Valores e as Atividades Corporais. P.103

[2] O termo controle, como aqui utilizamos foi definido por Deleuse por caracterizar a produção e multiplicação infinita de imagens que é capturada em um ambiente aberto, onde a subjetividade está capturada antes mesmo do corpo.

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